Por Luci Regina Muzzeti (UNESP)
Elaborar um relato de minha trajetória não é uma tarefa simples: requer reflexão, análise de longo percurso social, escolar e profissional. Também não é uma tarefa solitária porque, ao revisitar o passado, reencontro as minhas memórias, onde estão as pessoas que compartilharam dela .É um processo analítico de construção da própria história; de se deixar conhecer, de se reconhecer, de documentar os fatos mais importantes de uma trajetória dedicada aos estudos, à pesquisa, ao ensino e à extensão.
Minha trajetória no campo da educação iniciou-se quando me encaminhei para o Curso de Magistério, nível de 2º grau, na Escola Estadual de Segundo Grau “Doutor Álvaro Guião”. Lá passei anos maravilhosos; a docência sempre me encantou; eu queria mesmo ser professora e minha família apoiava essa ideia. Era o caminho natural para o gênero feminino da fração de classe média. Fiz universidade, também no campo da educação .Realizei o Mestrado e o Doutorado em Fundamentos da Educação na UFScar .Dediquei-me a estudar e pesquisar as trajetórias escolares do gênero feminino oriundos de diversas frações de classes e de díspares momentos históricos , à luz da teoria bourdieuniana, observando os condicionantes que interferem nas diferentes expectativas e comportamentos das famílias, em relação à escola, identificando sua influência no destino escolar , particularmente do gênero feminino, desmistificando aquilo que comumente chamamos de “vocação”, mostrando e revelando como a socialização leva as mulheres e os agentes sociais a confundirem o mito da vocação das qualidades congênitas, com o preparo desde tenra idade de meninas para ocuparem cargos e profissões que a sociedade patriarcal espera que ocupem.
Logo, ainda ,no ano de minha defesa de Doutorado, 1997, prestei concurso na UNESP e fui aprovada. Nossa, que felicidade! Nossa que conquista! Era tudo que eu almejava. Fiz Concurso de Livre -docência em 2019 e continuo me dedicando aos estudos de trajetórias dos diversos gêneros e ,mais especificamente, aos estudos das trajetórias escolares de estudantes que ingressaram na Universidade por meio de políticas de acesso, a fim de examinar seus itinerários escolares e, nessa direção, investigar as principais dificuldades e enfrentamentos que esses alunos, de diferentes gêneros , vivenciam no universo universitário, que podem dificultar, por sua vez, o prolongamento de sua carreira, visando a fornecer subsídios para que a UNESP organize políticas que auxiliem esses agentes a se manterem no espaço universitário, com êxito. As políticas definidas pela UNESP para a manutenção desses(as) alunos(as) no espaço escolar serão possíveis, também, por intermédio de pesquisas desta natureza, em última instância, porque elas permitem desvendar os meandros das dificuldades, insucessos e fracassos escolares desses agentes, de diferentes gêneros.
Nesse mês de março, mês que se celebra às mulheres, precisamos, ainda mais, revisitar nossos problemas sociais e seguir reivindicando uma sociedade igualitária para os diversos gêneros, etnias e grupos sociais.
A autora
Possui Mestrado em Fundamentos da Educação pela Universidade Federal de São Carlos (1992) e doutorado em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (1997). É professora Livre Docente em Sociologia da Educação da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Departamento de Educação . Foi Supervisora do CENPE – Unidade Auxiliar Unesp/Fclar de 01.02.13 a 31.01.17 e de 01.02.17 a 31.01.21. Foi Supervisora e
Coordenadora Adjunta do Projeto PACTO pela Alfabetização na Idade Certa, no Polo de Araraquara. Professora Permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar, na Linha de Pesquisa “Sexualidade, Cultura e Educação Sexual”. Vice-Coordenadora do Programa de Pós -Graduação em Educação Sexual Integrante do Núcleo de Estudos da Sexualidade – NUSEX com experiência na área de Educação, trabalhando com a abordagem de Pierre Bourdieu, com ênfase em pesquisas sobre habitus, gênero e trajetórias escolares.