Por Nadja Karina da Silva
O acesso à Universidade pública para negros e pobres é uma questão econômico-social em nosso país. Sucedeu, e se sucede, uma árdua luta para que seja mais isonômico o ingresso dessa população ao ensino superior. Ser uma mulher negra e de periferia dentro da Universidade demonstra por si só um ato político, uma vez que tudo é atravessado pela intersecção gênero, raça e classe.
Ainda nos dias de hoje, o ensino superior é elitizado. O acesso é historicamente limitado, necessitando de políticas públicas para a inserção desse público. Eu sou resultado de políticas afirmativas. É, estaticamente comprovado, que a população negra faz parte da parcela mais pobre do Brasil, e no ensino superior há um predomínio da classe média/alta, e em consequência, da população branca. Assim, logo compreendemos a necessidade das políticas que visam a inserção de negros e pobres na Universidade.
Mas para além disso, é essencial a defesa das políticas de permanência estudantil. A inserção desses grupos na Universidade é uma das etapas de inclusão, a manutenção desses grupos como estudantes é outra. Por exemplo, posso citar que para assegurar a minha graduação, foi necessário múltiplas jornadas além do ensino: o trabalho, o “bico”, entre outros. Ser bolsista de permanência estudantil proporcionou um melhor aproveitamento do ensino superior e de suas possibilidades, reprimindo até mesmo uma evasão. Foi uma segurança e do mesmo modo um desafogo da ansiedade com uma parte das múltiplas jornadas.
Outrossim é publicizar a presença e história de pessoas negras e pobres que se inseriram e permanecem na Universidade, não necessariamente as colocando para falar de suas dores. Essa postura que assumo demonstra que pode haver dentro da Universidade uma rede de apoio entre semelhantes. Pautar esse ideal em ações como o PET na escola, realização de palestras, composição de chefias e disseminação da importância do corpo estudantil pelo Centro Acadêmico, foram intervenções que realizei durante o ano de 2021 e que impactam direta ou indiretamente a comunidade externa à Universidade, demonstrando que aquele é um lugar que devemos ocupar com propriedade, podendo permanecer e se apoiar.
Essa é uma parcela da transformação social ensejada pela Universidade pública, que impactou e continua impactando não apenas a minha trajetória pessoal, profissional e acadêmica, mas também a de toda a minha família uma vez fui a primeira a ter acesso ao ensino superior e com isso mostrar meu potencial, proporcionando uma melhor perspectiva econômico-social para eles e para a geração posterior. Eu, que se quer me achava capaz de adentrar no ensino superior, tive acesso ao ensino superior PÚBLICO e o usufruo integralmente, tentando desfrutar ao máximo de suas possibilidades em ensino, pesquisa e extensão.
Conhecer essa possibilidade desde o ensino fundamental e médio é vital para despertar o interesse e os desejos desconhecidos da população que normalmente não tem acesso ao superior, além de indicar os caminhos para entrar na Universidade. Foi assim comigo, durante o Ensino Médio Integral que pude ver que a Universidade poderia ser sim uma alternativa no meu futuro. Pensar que concorreria com pessoas que tem um arcabouço educacional muito mais sólido que o meu, me fazia desanimar, mas com os professores assertivos que tive nos meus últimos anos de E.M., entendi que poderia ser contemplada através de políticas públicas afirmativas de inserção e permanência.
O ensino superior público concebeu a Nadja de hoje: proativa, com viés crítico, politizada, instruída e multiplicadora dessa realidade.
A autora
Nadja Karina da Silva, mulher jovem, negra e periférica, estudante de Administração Pública na UNESP Araraquara e atualmente Gestora de Projetos de Participação Popular no governo, foi vice-presidente do Centro Acadêmico CAAP, pesquisadora de violência doméstica e de gênero, bolsista no Programa de Educação Tutorial PET e de permanência estudantil e atua e atuou em diversos projetos de extensão.